Onde mora nossa essência
- alinebmariano7
- 10 de jan. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 22 de jun. de 2024
Volte no tempo. Você é criança. Agora, pense em algum dia que te transporte para algo que realmente te marcou e que é capaz de resgatar a sua essência mais profunda. Algo que te traga a felicidade que só uma criança pode ter, em acontecimentos simples. Eu vou te contar a minha história: boba, real e que enche meu coração de alegria.
Eu devia ter uns oito anos de idade e o meu irmão uns doze. Estávamos na chácara do meu pai e nos preparávamos para escolher alguma coisa para brincar e eliminar o “tédio” – sim, entre muitas aspas – que o nosso cantinho no meio do nada proporcionava para nós, crianças cheias de energia e cheias de vontade de se divertir.
A chácara era um refúgio que tinha um pouquinho do que cada um de nós mais amávamos. Tinha o meu quarto com estrelas coladas no teto (aquelas que brilhavam no escuro), um alçapão incrível no quarto do meu irmão (igual aos filmes americanos) e tinha todos nós juntos, sempre que possível – essa era a parte que a minha mãe e o meu pai mais gostavam e, hoje, é a minha parte preferida também.
À noite, costumávamos levar algum VHS para assistirmos e, à tarde, éramos sempre criativos para brincar (fora de casa, como boas crianças raízes, que éramos e somos). E foi em uma tarde de tempo bom e criatividade no auge, que o meu irmão olhou para mim e falou, com muito carinho, como de costume:
- Otária, eu tive uma ideia. Vamos pegar a nossa bicicleta e brincar de matar uns orcs.
- Adorei! Como? - respondi animada.
Sim, a gente amava Senhor dos Anéis (eu amo até hoje).
Como uma irmã mais nova, eu dificilmente recusava alguma brincadeira que ele propunha - eu achava sempre o máximo. Então, agora, eu só queria entender qual era a ideia para começarmos a colocar nosso plano em prática e ajudarmos o Frodo a conseguir destruir o anel.
Ele me explicou tudo! Primeiro, fomos até a oficina do meu pai (um quartinho cheio de equipamentos) e pregamos algumas ripas de madeira para formarmos duas espadas – uma para cada um. Nossos cavalos seriam nossas bicicletas e o terreno da chácara seria o espaço da narrativa que íamos começar a construir.
Com uma das mãos, a espada, com a outra, o guidão da bicicleta – absolutamente impossível para a minha quase inexistente habilidade. Eu dava tudo de mim e suava frio, enquanto o infeliz do meu irmão (que sempre foi bom em todas essas coisas), desfilava, pedalando por todo lado. Na nossa história, ele, provavelmente, era o Aragorn, e eu, com certeza o Legolas (meu preferido), e estávamos indo muito bem na nossa jornada. Ok, ele bem melhor do que eu, mas não era uma competição, ou era?
Desbravamos terras, matamos muitos orcs e ajudamos o Frodo na saga da destruição do anel. Nossa missão estava cumprida!
O que eu não esperava, era carregar essa memória até hoje (22 anos depois) – e, provavelmente, por toda minha vida. Eu não esperava que uma brincadeira tão boba fosse capaz de moldar tantas coisas dentro de mim e fazer eu resgatar quem eu sou, mesmo quando tudo parece tão distante e tão diferente.
Foi em uma das minhas meditações, tentando me reconectar comigo mesma e buscando respostas que conseguissem me guiar, que eu cheguei a essa memória, guardada lá no fundo. Ela me trouxe uma alegria gigante, resgatando traços profundos da minha personalidade, que me ajudou a lembrar quem eu sou. E eu precisava lembrar.
Tenho 30 (quase 31) anos, tenho uma carreira, uma casa, planos e sonhos. Mas eu também sou a Aline que brincava em dias de Sol e que ainda pode se permitir a rir e se divertir com o bobo, com as coisas mais simples que a vida dá. E quando eu penso na chácara e em todos os orcs que combatemos, eu fico feliz. Feliz como uma criança que tem estrelas que brilham no teto.
E que mal tem ser feliz como uma criança? Que mal tem a gente gostar de criar, imaginar, brincar, se divertir e acreditar? Quem sabe até não foi isso que me fez sonhar em ser escritora? Quem sabe o quanto cada pequeno acontecimento da nossa vida determina em nossas escolhas futuras? Quem sabe?
Que mal tem a gente, às vezes, querer rir do bobo, do ingênuo e do inofensivo? Nem sempre precisamos ser inteligentes, nem sempre precisamos ter todas as respostas. Às vezes, só precisamos nos divertir para nos reconectarmos com a nossa essência e nos lembrarmos quem somos.
Divertir, imaginar, brincar, rir. Isso tudo também é coisa de adulto – mas faça, como uma criança faria.
Precisamos, às vezes, nos divertir como uma criança.
E toda vez que a vida estiver séria e difícil demais, eu vou pegar a minha espada e vou me preparar para combater alguns orcs por aí.
Você vem comigo, precioso? Opa, curioso?
Texto lindo, retrata tudo com detalhes, parabéns.
Que lindo esse texto! Ele me fez voltar no tempo, que saudades...
Fico muito feliz em saber que você tem boas recordações da sua infância, isso para uma mãe é muito gratificante.
Hoje em dia algumas pessoas acreditam que para seus filhos serem felizes é preciso enchê-los de presentes caros, quando muitas vezes a felicidade está nas pequenas coisas e na simplicidade.
Parabéns, filha!!! 👏🏼 👏🏼👏🏼👏🏼
Incrível ☺️👏🏾👏🏾👏🏾